terça-feira, 18 de agosto de 2015

Sonic Blast Moledo: Dia 2

Acordei e encontrei-me adornado pelo acolhedor âmago da tranquilidade. Apenas se ouvia o canto primaveril dos pássaros contrastando com a ambiência outonal que no exterior da tenda ganhava evidência. Facilmente nos desprendemos do reconfortante ambiente que a tenda nos ofereceu durante toda a noite e caminhámos até ao centro de Moledo a fim de almoçarmos por lá. Não é costume publicitar restaurantes, mas a pizzaria “Hamilton” é merecedora dos mais altos elogios. Descobrimos esse espaço em 2014 e não mais conseguimos dissociar “Fome em Moledo” de “Hamilton”. Depois de almoçados caminhámos calmamente até ao recinto do festival.

Seguiam-se os Vircator e fazíamos enorme questão em vê-los. A banda “da casa” dedilhou a sua envolvente e contemplativa musicalidade perante uma plateia que ainda ganhava dimensão. O quarteto natural de Viana do Castelo brindou-nos com uma performance esclarecedora e arrebatadora, mostrando o encantamento e complexidade de um Post Rock, que muitas das vezes se convertia em Psych Rock e até num Doom fulgurante e capaz de desatar alguns pescoços mais inibidos da plateia. Foi uma exibição admirável e merecedora de um longo e sincero aplauso que se fez sentir assim que a banda desligara os amplificadores. Seguiam-se os exuberantes Galactic Superlords, provenientes da Alemanha, que traziam o seu musculado e virtuoso Hard Rock. Atrelado aos 70’s, este quinteto impressionou todos os presentes com uma exibição enérgica e entusiasmante. Todas as atenções estavam ancoradas em Galactic Superlords e no seu Hard Rock provocador. As colunas contorciam-se com a berrante e corpulenta voz de Katharina Heldt que de punhos cerrados no microfone assombrou os semblantes de uma plateia assumidamente conquistada. Pertenceu a eles uma das mais conseguidas prestações no palco da piscina. Estavam aí os Astrodome dispostos a projectar as nossas consciências tão para lá daquele céu pardacento e conduzi-las ao fecundante e espantoso universo de firmamentos estelares. Este quarteto natural do Porto (e recente aquisição do estúdio minhoto Hertzcontrol) colocou os capacetes de astronauta e avisou Houston sobre o sucesso da sua descolagem. Juntamente com eles foi toda uma plateia embriagada pelo seu Heavy Psych muito bem trabalhado e conduzido. A chuva começava a cair com crescente intensidade mas a anestesia promovida pela sonoridade lisérgica de Astrodome impedia-nos de senti-la embater nos nossos rostos adormecidos. Este quarteto de instrumentos apontados ao Cosmos, provocou em mim uma das mais profundas hipnoses vividas naquele palco. Não foi fácil regressar de Astrodome e aterrar em mim. Depois de terminado o concerto, foi tempo de voltar à tenda a fim de saciar a fome e relaxar um pouco antes de experienciar os ucranianos Somali Yacht Club. Foi já debaixo de uma chuva torrencial que regressámos ao recinto do festival. Pelo caminho cruzámo-nos com muitos festivaleiros que no sentido inverso ao nosso procuravam abrigo. Mas a nossa vontade em ver Somali Yacht Club era impermeável à chuva e assim seguimos a passo longo e confiante rumo ao palco da piscina. Quando chegámos, já o power-trio havia dado início ao concerto perante uma plateia reduzida face ao poderio da chuva que tardava em abrandar. Foi-me muito especial ter vivenciado o álbum “The Sun” ao vivo (não o tivesse considerado um dos melhores 10 discos de 2014). Também resistentes à chuva, os Somali Yacht Club não deixaram de dar um concerto de natureza tremendamente fascinante exibindo com distinção o seu Post Rock/Psych Rock. A meio do concerto a chuva lá cedeu às nossas súplicas e a plateia em frente ao palco ganhou vistosa vivacidade. A banda deu um concerto tremendamente viajante e sedutor fazendo com que o publico se contorcesse prazerosamente e de olhos cerrados perante a melosidade tanto instrumental quanto vocal. Aposta ganha da organização do Sonic Blast neste trio ucraniano que provou ser merecedor de novas convocatórias.

Seguiam-se, no palco principal, o power-trio francês Libido Fuzz (também eles orientados pelo estúdio Hertzcontrol). Sou um confesso admirador desta banda de ares sessentistas e setentistas que gera uma profusão sonora que facilmente me estimula e endoidece. A banda arrancou para uma exibição estonteante e dominante, transpirando o seu Heavy Psych n’ Blues imensamente narcotizante. Libido Fuzz foi uma verdadeira ode à euforia e a plateia mostrava toda a sua satisfação em comungar esta verdadeira descarga sónica. A última noite do Sonic Blast começava da melhor forma com este tridente francês a agitar a maré humana que ia ganhando dimensão em frente ao palco. De seguida foi a vez dos alemães Wight subirem a palco com o seu característico Psych Rock temperado pelo Funk, quanto que nós aproveitámos para nos distanciarmos do recinto e comer algo pela zona de restauração do festival. Não demorámos a regressar ao recinto, pois os extravagantes The Vintage Caravan estavam aí prontos para provocar em nós todo um alvoroço emocional. Este power-trio natural da Islândia deu um dos melhores concertos do festival, surpreendendo todos os presentes com a sua combustão fervilhante de Heavy Psych praticado com vistosa excentricidade e exaltação. Estes três músicos preencheram todo um palco com a sua inquietude explosiva e electrizante. Foi demasiado fácil conquistarem o público que nem sabia como responde a toda aquela indomável erupção de solos perfeitamente delirantes e riffs tremendamente vigorosos e entusiásticos. The Vintage Caravan deram um concerto irrepreensível e de ressaca duradoura (a par de Greenleaf e My Sleeping Karma já falados anteriormente aqui). Estavam aí os Pentagram, a banda mais aguardada pela maioria dos festivaleiros que – em peso – marcaram presença nesta edição do Sonic Blast. Não é todos os dias que se vê (e ouve) uma verdadeira lenda viva do Doom Metal chamada Bobby Liebling e cada um de nós sentia o peso do orgulho e da expectativa. Os recém-regressados aos grandes palcos deliciaram toda uma plateia sedenta de Pentagram, e foram os temas clássicos a recolher os maiores aplausos e gritos eufóricos. Muito provavelmente fora o concerto em que testemunhara a maior aderência de sempre no Sonic Blast, e os Pentagram estiveram à altura desse honorável estatuto. A banda norte-americana arrancou para uma performance que não deixou ninguém indiferente. A sonoridade inquisidora destes dinossauros do Doom Metal impôs a que todos lhe obedecessem incondicionalmente. No final do concerto estávamos todos visivelmente vaidosos por ter assistido a Pentagram e a tudo o que isso significa e significará futuramente. Para encerramento do festival, a organização escolheu os germânicos Mother Engine e devo antecipar que foi uma bela aposta. Este power-trio arrasou toda uma plateia em êxtase com o seu Psych Rock verdadeiramente aliciante e efusivo. O público respondia como podia, embatendo entre si, perante toda aquela veemente descarga de riffs possantes e solos desarmantes. Foi um concerto de um só sentido: a euforia crescente e contagiante.

Regressámos à tenda ainda a gravitar a ebriedade, fruto de tudo o que havíamos testemunhado ao longo destes dois dias de Sonic Blast. Admitimos mutuamente tratar-se da edição mais especial do histórico deste festival e reforçámos o laço de cumplicidade que nos manterá eternamente na sua órbita. Parabéns ao Ricardo e à Telma pela renovação do seu sonho acordado que é (e deve ser) também o nosso! 

Até para o ano, Sonic Blast!

Sem comentários: